sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Vida sexual: de ficção ou real?


Há cerca de dois meses li no Jornal de Notícias um artigo com o título "Vida sexual de ficção impõe-se como ideal", escrito por Eduarda Ferreira. E mais abaixo, como subtítulo, podia ler-se que a "erotização da sociedade e dos bens mais insignificantes dita padrões de desempenho aos indivíduos e casais". Aqui deixo a transcrição completa:

Todos mentem aos outros ou a si próprios quanto à actividade e satisfação sexual. A "culpa" será das mensagens erotizadas que se colam até às coisas mais comezinhas, numa sociedade que vê o sexo como um recurso finito.

A publicidade feita a bens tão simples como um iogurte generaliza a ideia de que o desempenho sexual de cada um deve ser perfeito, frequente e duradouro, mas a realidade será bem diferente. Apesar de as pessoas não o admitirem. Ou de só o confessarem em inquéritos, com a segurança do anonimato, e sob garantia do segredo profissional de médicos ou psicólogos. Elas estarão fartinhas do sexo. Pelo menos estarão cansadas de ter de cumprir os padrões mediatizados , inclusivé pelo cinema. Esta a perspectiva ontem transmitida por Stuart Walton, que ontem participou nas conferências "As Regras da Atracção", na Culturgest, comissariadas por Rui Trindade.

Segundo aquele ensaísta britânico, as consultas têm muita gente a queixar-se de cada vez fazer menos sexo. Mas, o que importará, segundo Stuart Walton, é que as pessoas, em vez de terapia, tenham mais tempo juntas, "tempo romântico, que pouco cabe nas vidas de rotina". Ainda na sua opinião, há a tendência para "um espírito de contabilista" quanto à periodicidade dos actos sexuais. Interroga-se Stuart Walton "por que razão tem de ser problema a falta de sexo e a necessidade deste não pode ir e vir como qualquer apetite?". O ensaísta considera também que havendo, numa relação prolongada, a tendência para a marginalização do sexo, este não pode ser o elemento definidor dessa relação. O sexo pode ter sido "o feriado", o que uniu o casal numa primeira fase e o desaparecimento do desejo pode ser natural. Até porque houve, entretanto o "efeito corrosivo" de realidades como a preocupação com os filhos e as rotinas diárias domésticas e do trabalho. Ainda assim, para essa fase, o conferencista aconselhou a "programar o sexo nessa vida atarefada".

Uma abordagem distinta foi feita pela socióloga Anália Torres, que falou dos vínculos emocionais e da forma como nas últimas décadas se reorganizaram os espaços da família, do amor e da relação com o trabalho. Afirmou a investigadora que se tem apostado mais no íntimo, o que constituirá uma espécie de refúgio, dado que cada vez se controla menos outras circunstâncias da vida, a começar pelo emprego. Anália Torres disse que nos últimos anos têm passado para a esfera pública questões antes ocultas. É o caso da interrupção voluntária da gravidez, da nova lei do divórcio, do casamento de pessoas do mesmo sexo, dos maus tratos a mulheres e crianças e da paternidade biológica e afectiva. Tudo questões que, curiosamente, surgiram nas sociedades espanhola e portuguesa em tempos quase simultâneos. "Tudo o que sucede em Espanha está também a acontecer cá", constatou Anália Torres para adiantar que "as pessoas reclamam direitos que antes pareciam não-reclamáveis".

Sublinhou a mesma socióloga que se gerou uma necessidade de compensação pondo ênfase no foro íntimo porque, apesar de maiores oportunidades individuais, também passou a haver maior risco e incerteza. Referindo dados recentes, Anália Torres lembrou que os europeus põem a família em primeiro lugar, seguida dos amigos, do lazer e trabalho. E admitiu ainda que a criança pode estar a ser vista como uma saída afectiva para as dificuldades emocionais entre os adultos.


Pareceu-me na altura um artigo interessante que versa uma questão que diz respeito a toda a sociedade. E continuo a achá-lo interessante. Então porque apenas agora o transcrevo? Porque, por vezes, gosto de maturar as coisas.

8 comentários:

Tia Brites disse...

Nisto tudo, gostei particularmente do nome da socióloga.

Anónimo disse...

É coisa para se pensar... E num país, como o Brasil, onde a sexualidade está à flor-da-pele, é coisa para se questionar se na verdade tudo não passa de uma fantasia de carnaval.

mfc disse...

Normalmente são mais as vozes que as nozes!

nandokas disse...

Olá Tia Brites,
Foi por causa desse nome que andei este tempo todo a maturar as coisas: é éne ou éme? é éne ou éme?... Até hoje ainda não sei.

nandokas disse...

Olá Senhora,
É mesmo coisa para pensar... Mas não acho que tudo seja fantasia [embora tenha de haver fantasia...]
Beijos

nandokas disse...

Olá mfc,
Pois...
Abraço

Andre Martin disse...

Olá! Esta é a primeira vez que venho comentar aqui. Havia visto este seu post há alguns dias, mas quando volto aqui, vejo que já há novidades.

Sobre vida sexual e seu relacionamento com a realidade, escrevi dois ensaios, um deles é quase uma transcrição de uma reportagem de revista sobre pesquisa e estudos recentes.
Se você tiver oportunidade e paciência de ler, seus comentários e opinião seriam bem vindos.

http://mesdre.blogspot.com/2008/12/debate-polmico.html

http://mesdre.blogspot.com/2009/01/de-volta-com-tema-polmico.html

e já que o último traz à tona o eterno debate das diferenças entre homens e mulheres (no seu modo de pensar, agir e comportamento social), outro post (um tanto infame, é verdade), mas com uma boa indicação de vídeo para se assistir:

http://famainfame.blogspot.com/2009/01/inevitabilidade-irritante.html

Obrigado. Abraço.
Andre M

pin gente disse...

parece-me interessante embora eu ache que há assuntos que não fazem estatísticas. isto é assim tipo... cada um sabe de si...

beijos