quinta-feira, 11 de janeiro de 2007

Tretas e... a TLEBS


Muito se tem dito e escrito acerca da TLEBS. Tenho, por hábito, não manifestar a minha opinião quando se trata de temas acerca dos quais não tenho conhecimentos ou dados suficientes. E, nestes casos, das duas, uma: ou não digo nada ou, então, vou à procura de elementos que me auxiliem a formar um juízo acerca da questão.

Foi isto que fiz em relação à TLEBS.

Comecei por anotar o 'post' da saltapocinhas dedicado à TLEBS, colocado em 09/12 pela , do qual me permito respingar para aqui uma parte do texto:
"Eu ficava feliz se cada aluno que termina o 12º ano soubesse escrever um texto escorreito e perceptível, e tivesse lido meia dúzia de obras de bons escritores na íntegra!!
Primeiro nasceu a língua, depois é que inventaram a gramática!
E se deixassem as complicações gramaticais para quem vai seguir cursos de línguas?
E que os professores fiquem apenas a ensinar os seus alunos a gostar de ler e a saber escrever!"

Depois disso fui 'navegar' até ao blogue A Origem das Espécies e verifiquei que o seu autor em 08/12, no 'post' intitulado "De facto, é o fim. [A TLEBS]", fazia referência a um artigo do Prof. João Andrade Peres, publicado no mesmo dia na revista do Expresso, e ainda aconselhava a ida ao 'site' daquele professor catedrático para quem quisesse consultar a versão alargada da sua posição acerca desta problemática (da qual, o autor do 'post' apresenta uns extractos). Do texto escrito por Francisco José Viegas naquele 'post', tomo a liberdade de transcrever o seguinte:
"Depois deste artigo corajoso e ponderado (que não pôe em causa a evidente necessidade de alterar a terminologia actual - no que parece todos estarmos de acordo) não resta outro caminho, à Ministra da Educação, senão repensar muito seriamente tudo o que está a ser feito nesta matéria. Andrade Peres faz sugestões muito úteis (uma delas seria a de uma Terminologia da Disciplina de Português, por exemplo, para acabar com a guerra inócua entre Linguística & Literatura no Secundário), efectua uma separação das águas muito útil para que não se confunda a sua argumentação com a de alguns comentadores generalistas e ignorantes; salienta alguns aspectos positivos da terminologia; e desmonta passo a passo, ponto por ponto, a TLEBS. Em meu entender, é o fim da TLEBS (ver ainda o artigo de Jorge Morais Barbosa no JL). Seria uma vergonha se o Ministério permitisse a continuação do descalabro."

Mais tarde, no semanário Sol do passado sábado, li o "Blogue" de Marcelo Rebelo de Sousa, em que, no segundo ponto do texto "Língua e confusão", afirma:
"E que dizer da TLEBS (Terminologia Linguística dos Ensinos Básico e Secundário) que arrancou torta em Portugal? Começou no Secundário e não no Básico; com calendário confuso; sem formação suficiente; sem coordenação e Gramática de referência para as escolas (as existentes são contraditórias); complicando a análise da Língua onde se pretende simplificadora.".
E um pouco mais adiante, aproveitando o exemplo dado pela revista Visão, na sequência de um artigo de João Paulo Guerra no Diário Económico, Rebelo de Sousa termina:
"... a palavra 'cão' passa de substantivo comum masculino a nome comum, contável, animado e não humano. E onde havia pronomes, adjectivos e advérbios, surgem quantificadores, advérbios disjuntos, modificadores preposicionais, adverbiais e frásicos. Vamos a isto, que a TLEBS é fascinante: apaixona algumas dezenas de milhares de jovens e crianças. Ou não?"

Já anteontem, naquele blogue de Francisco José Viegas, este autor volta a falar da TLEBS, fazendo, neste caso, referências a declarações prestadas pelo director-geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular, do Ministério da Educação. Aqui apenas vou citar do texto a parte que acho essencial:
"... afirma que a TLEBS tem deficiências e que a maior parte delas só se corrigirá depois de serem identificadas "na prática com os alunos", que servirão de cobaias para uma terminologia que "tem deficiências", como reconhece à partida.".

Li depois o artigo de opinião de Vasco Graça Moura, publicado em 21/12/2005 no Diário de Notícias, com o título "A TLEBS no sapatinho", de onde, quase ao início, fui buscar:
"A TLEBS baseia-se numa linguagem técnica de acesso difícil e em conceitos que não fazem parte da gramática tradicional e são desconhecidos da maioria dos professores. Assenta em critérios sintácticos que se sobrepõem aos critérios semânticos em termos radicalmente novos.".
E mais adiante, pode ler-se:
"Não há nenhuma gramática portuguesa que assente na TLEBS. Não há nenhum professor do básico ou do secundário que a conheça bem.".
E o artigo termina assim:
"Não sou professor, mas os professores que me contactaram merecem-me toda a credibilidade. Se as coisas são assim, ter-se-à a ministra da Educação apercebido da catástrofe? Terá visto bem a prenda que o Pai Natal pôs no sapatinho da língua portuguesa?".

Posso referir ainda o blogue semrede onde o seu autor escreve em 27/11/2005 o texto "TLEBS comparadas", que considero bem argumentado e esclarecedor. A quem estiver interessado nesta questão, aconselho a consultar este blogue. Mas não resisto a citar um excerto do comentário colocado no 'post' por "Lena b" no dia 01/12/2005:
"Demorei a comentar porque toda esta polémica acerca da TLEBS me parece completamente surrealista. Primeiro, porque, para ser levada a sério, teria de ter começado há dois anos e não apenas agora. Segundo, porque me parece que, de repente, toda a gente se transformou em linguista - até o Miguel Sousa Tavares e aquele rapaz do "gato Fedorento". Terceiro, porque, à medida que vou lendo os artigos desses "linguistas de bancada", cada vez me convenço mais de que querem transformar um assunto científico num problema político. E o pior é que estão a conseguir, pois a Ministra da Educação já afirmou recentemente, numa entrevista, que as reclamações deviam ser endereçadas ao anterior Governo, que tinha publicado o Decreto... Mas agora a gramática também está ao serviço da oposição?!".

Temos também, para consulta, a portaria nº 1488/2004 de 24/12, que consagra a TLEBS como experiência pedagógica, e a portaria nº 1147/2005 de 08/11, que alarga a aplicação da nova terminologia a todas as escolas do ensino básico e secundário.

Ainda temos a petição on-line contra a implementação da experiência pedagógica TLEBS.

E, creio, deverá haver muitos mais artigos, textos, opiniões, etc., que não tive sequer conhecimento da sua existência.

Certo é que a problemática da TLEBS não é pacífica, temos muita polémica à sua volta. Há pessoas, com reconhecida formação académica na área da língua portuguesa, que são a favor da TLEBS, embora também notem deficiências que será necessário corrigir. Outras, de nível académico idêntico, são contra a TLEBS, porque, não sendo contrárias à actualização da terminologia tradicional, entendem que "apresenta deficiências e lacunas de uma gravidade tal que fazem desta terminologia, tomada na sua globalidade, um objecto que não merece crédito científico, que envergonha a Linguística portuguesa e o próprio país e que não se entende como pode estar a ser introduzido no sistema de ensino." - palavras do Prof. João Andrade Peres no artigo já referido.

E, então, qual é minha posição? Sou contra a implementação da TLEBS! Sou contra porque, em muitas escolas do ensino secundário, cujos alunos já foram abrangidos no ano lectivo corrente, a formação dos professores ainda não está finalizada. Sou contra por causa da confusão que se vai criar nos alunos do secundário habituados durante vários anos a fazer uso da terminologia tradicional. E ainda sou contra porque, embora sabendo que "a língua é, pela sua natureza, um 'objecto' dinâmico" e que "a gramática tradicional e normativa depressa se torna obsoleta e incapaz de dar conta de todos os fenómenos que nela ocorrem" - palavras de "Lena b", citada acima, a TLEBS "arrancou torta" - como disse Marcelo Rebelo de Sousa.

Finalmente, sou contra porque, tendo em conta o futuro dos meus netos menores [uma prestes a terminar o ensino básico], não perspectivo, nem agora nem há mais de trinta anos, vontades concertadas dos poderes políticos, quaisquer que sejam as suas cores, de modo a se implementar em Portugal um sistema de ensino coerente no seu todo, atraente para quem ensina e para quem é ensinado e eficaz na sua interligação com a vida real do país que somos todos nós.

E, por tudo isto, já posso dizer: venha daí a 'petição on-line para eu assinar!

3 comentários:

nana disse...

a petição já existe e está aqui
http://www.ipetitions.com/petition/contratlebs/tlebs.html
já em tempos publiquei umas linhas sobre este polémico tema lá no estaminé e sempre pasmo como pululam as opiniões sem a correspondente argumentação científica!!
Mas de facto acho que a nova terminologia "nos fica curta nas mangas" e exige um esforço de abstração que para o 1º e 2º ciclos do básico( até ao 6º ano) exige um esforço de abstração que muitos alunos poderão encontrar como um obstáculo desmotivante. Para o 3º ciclo e secundário pode resultar, se for bem operacionalizada e se daí advir uma reflexão mais profunda e transparente àcerca da Língua(sera?)
Já fui a um congresso sobre este tema na e pude verificar que a dúvida e descontentamento eram comuns aos (doutos) oradores e à plateia!
Quanto à eficácia das petições, a julgar pelo resultado do Rivoli, estamos conversados!!
;)

saltapocinhas disse...

Grande estudo, sim senhor!
O meu post não era estudo nenhum, era apenas uma opinião.
Mas espero que isto "morra" antes de chegar ao 1.º ciclo!!
E não tens de pedir desculpas por me citares, antes pelo contrário, eu é que agradeço!
bjs

Luis Filipe Redes disse...

Obrigado pela referência ao Sem Rede, o meu blog.
Vi que estudou antes de formar uma opinião e tomar uma posição.
Eu também não tenho feito outra coisa no Sem Rede que é da minha inteira responsabilidade, isto é, sou o único autor.
A minha opinião é diametralmente oposta à sua, pois considero que suspender a tlebs não resolve problema nenhum. A nomenclatura de 1967 já morreu na prática, há muitos anos que ninguém lhe obedece. Quanto às deficiências da tlebs, não há acordo entre os críticos. Por exemplo, João Peres não concorda nem com as críticas do Vasco Graça Moura nem com as da Alzira Seixo e a aplicar-se a opinião dele, o resultado seria uma terminologia muito mais polémica do que a actual.
Por isso, acho que o que deve ser feito é corrigir o que estiver errado e aperfeiçoar o que pode ser melhorado.
O problema principal não são os nomes das coisas:
- nome ou substantivo, ok., diga nome ou substantivo, qual é o problema?
- frase ou oração? Muito bem, diga frase ou oração!
O problema principal são os conceitos, com as suas definições:
- O que é e como se determinam o sujeito, o predicado, os complementos directo e indirecto de uma frase ou oração? O predicativo do sujeito e o predicativo do complemento directo?
- Que tipos de palavras há quanto à sua função na frase, como se definem e como se classificam?
- Que funções sintácticas existem na frase e como se determinam?
A TLEBS pode ser muito complexa na discussão linguística, mas não torna a gramática mais complexa para os alunos. Deverá torná-la mais lógica, portanto mais compreensível.
Não gosto de falar de "gramática tradicional" porque é uma coisa que não existe. Os grandes gramáticos são também linguistas e sempre inovaram nos seus textos. Acho que é uma oposição falsa.
Veja, por exemplo, a minha gramática de 1971, do meu 4º ano do liceu: em 1975, os autores, inseriram uma introdução com conceitos básicos de linguística de Saussure e Jakobson. Tinham vontade de inovar! Veja o Lindley Cintra e o Celso Cunha, puseram análise sintagmática, com árvores de frase no seu muito citado manual de gramática.
Agora, se quiser, compare a definição de sujeito e de predicado das duas gramáticas que acabei de referir. São completamente diferentes! As do Lindley Cintra estão mais conformes à definições da TLEBS.
Na gramática do Nunes Figueiredo, A frase "Eu fiz um comentário exageradamente grande no Tretas", o predicado seria apenas o verbo "fiz", para o Lindley Cintra, seria "fiz um comentário exageradamente grande no Tretas", tal como para a TLEBS!
Ora, conheço professores que ensinam este assunto como o Nunes Figueiredo, 1975, outros, como eu que ensinam como o Lindley Cintra e a TLEBS. Eu, honestamente, só posso dizer que os primeiros estão errados. Por exemplo, se um aluno considerasse "fiz", como predicado, eu poria "errado"!