Era Verão. O tempo estava soalheiro, com temperatura amena. E as milhares de pessoas que circulavam naquele fim de tarde de sábado pelo Hyde Park, em Londres, certamente que desfrutavam daquele sítio de modos diversos. Umas passeavam pelos caminhos longos do parque, outras jogavam à bola ou piquenicavam nos relvados bem tratados. Mais umas quantas, a maior parte jovens, deitadas na relva, davam largas aos seus sentimentos através de abraços e beijos. E outras ainda deambulavam pelo espaço do Speaker's Corner, à espera de oradores.
E é naquele espaço que a cena se desenrola. Um homem, quarentão, talvez a rondar por metro e oitenta de altura, com bom aspecto físico, caminha em direcção à referida zona, sem pressas. Traz consigo, debaixo do braço, um pequeno escadote metálico. A certa altura, pára, assenta os pés do escadote no chão, abre os seus três degraus e sobe-os até ao topo. E, então, começa a falar, a tentar captar ouvintes.
No início, a sua audiência resumia-se a um casal de meia idade. Mas, com o correr dos minutos e o interesse do tema, já duas dezenas de pessoas rodeavam o orador. E este falava, com entusiasmo, dos casamentos entre mulheres e homens. Convicto, afirmava ser adepto incondicional deste tipo de casamentos e, por isso, expunha os seus argumentos quanto às virtudes e propósitos dos mesmos, dando até como testemunho a felicidade que sentia com o seu próprio matrimónio que durava há mais de vinte anos. Diria, depois, não dar valor aos casamentos entre pessoas do mesmo sexo [casamentos entre aspas, ironizava ele] e que parecia estarem agora muito na moda.
É nessa altura que alguém da assistência se manifesta. Trata-se de uma mulher de estatura média, quarentona quase a passar para o nível seguinte, com um rosto redondo, agradável à vista, e um corpo onde se nota que a cintura alinhou com os ombros e com as ancas. Estava de mão dada com outra. Esta era um pouco mais alta, talvez com quarenta feitos há pouco, de rosto giro e um corpo bem torneado nas suas curvas. Pelo jeito da mão dada e pelas carícias que ali já se proporcionaram uma à outra, poder-se-ia afirmar, sem medo de errar, que estas duas mulheres são lésbicas.
Dirigindo-se ao orador, a primeira delas refere, então, que aquilo tudo que ele tinha dito não passavam de balelas sem qualquer sentido. E adianta que foi casada com o pai dos seus dois filhos durante vinte anos, mas que, apesar disso, não guardava boas recordações desse tempo. Agora, e desde há cinco anos, está a viver uma nova relação com a sua companheira e sente-se feliz como antes nunca tinha sido. Apanhando a deixa, a outra decide também dizer alguma coisa. Afirma que casou aos vinte e três anos com um homem, mas que o casamento não chegou à dezena de aniversários, devido a razões várias que, agora e ali, não vinham ao caso. Diz ainda que não teve filhos, ao contrário da sua companheira, mas que, como ela, também não fôra feliz com o primeiro casamento. Adianta que agora sim, que encontrou a felicidade com este novo amor. E remata dizendo que a relação com a actual companheira é para durar.
O homem, de pé no cimo do escadote, ouve-as durante aqueles minutos sem as interromper. Mas, logo que a mais nova parou de falar, aponta um dedo indicador na direcção das duas amigas e diz-lhes, em tom trocista:
- Quereis saber porque razão os vossos casamentos anteriores falharam?... Foi porque vocês não casaram comigo. Com umas boas quecas vocês não teriam acabado com os vossos casamentos...
As duas companheiras resolvem não ouvir mais. Rodopiam nos calcanhares e vão-se embora, mas, antes, a mais velha ainda resmunga em volta alta:
- Vai-te foder!...
Nota: A imagem acima foi obtida na Wikipédia.
3 comentários:
Brutal!!! :D Ainda não o tinha lido...HEHEHEHEHE!! Agora fizeste-me rir alto! Mas nem só de boas quecas se fazem casamentos. Aliás, penso que muitas pessoas homosexuais, procuram também um entendimento da sua natureza que só encontram com um semelhante (sobretudo as mulheres, não?).
Vim cá de propósito novamente! Não sabes como o teu "ahahah" me deixou irritada (mas a rir). Mas não, não és tu o orador. Como prometi comentar depois, deixo apenas aqui o registo que gosto imenso da forma como o escreveste. És muito claro, não te repetes (coisa que "invejo"), encadeias bem e tens requintes de adjectivação. Escreve contos! ;) fica o desafio.
o meu pai não me deixa comentar este post...
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